quarta-feira, julho 20, 2011

Acordo Ortográfico ou o perfeito exemplo de publicidade enganosa




Muito se tem falado nos últimos anos, mas com maior intensidade nesse último, sobre o acordo ortográfico, como é um assunto que interessa ou devia interessa a toda a gente, venho também dar a minha opinião.

O acordo ortográfico e todo o seu processo de divulgação faz-me lembrar a publicidade que metem na caixa do correio a dizer que ganhei um prémio, ou as publicidade dos bancos e créditos das promoções com grandes letras gordas a dizer "Abra uma conta e não pague juros"; "não pague comissões", "Ganhe facilmente 50.000 euros", mas claro como em todos essas palavras gordas, para captar a atenção das pessoas, existe sempre o asterisco e as letrinhas pequeninas, microscópicas com as condições a dizer que não é bem assim o que está escrito nas letras gordas. É basicamente a mesma situação com o acordo ortográfico.

Este AO é uma ilusão vendida por meia dúzia de senhores (Malaca Casteleiro e Evanildo Bechara e o falecido António Houaiss que devia ter levado este acordo para debaixo da terra também) onde apresentam como argumento, as tais letras gordas, a "Unificação da língua portuguesa" "simplificação da ortografia" "evolução da língua"

No entanto, todas essas palavras sensacionalistas contém o tal asterisco que demonstra que não é bem assim e é disso que vou falar, dos desmistificar os mitos deste AO, o texto é longo mas acho que é importante mostrar todos os baralhos das cartas:

A questão da percentagem:
Os acordistas afirmam: "ah, mas é só 1.6% que vai ser alterado, não se nota!" errado, o problema é que esses 1.6% incidem em palavras com uma taxa de utilização muito superior aos 1.6%, não estamos a falar de 1.6% de palavras que raramente se dizem ou se escrevem, como aqueles termos mais técnicos e complexos.

Questões técnicas: Este acordo cria um completo atropelo nas regras gramaticais e na acentuação das palavras na ortografia PT-PT. Eu não quero prolongar muito com os aspectos técnicos, mas posso apresentar este documento elaborado por um dos melhores professores sobre a língua portuguesa em Portugal que é o professor António Emiliano (não é maçador nem demasiado técnico, não é preciso ser licenciado em línguas ou ter tido grandes notas a PT na escola para entender o que está escrito)

http://issuu.com/roquedias/docs/emiliano-cesc

Como dá para reparar, a ideia de simplificação da ortografia como gostam os defensores desse acordo catalogá-lo simplesmente não existe neste acordo.

Colonização por parte do Brasil a Portugal? Não, repugno os comentários que dizem que vão passar a escrever à brasileiro, não irá acontecer isso, irei explicar mais abaixo. No entanto, não posso deixar de dizer que este AO (que é de 1990) ganhou importância nesses últimos anos muito devido ao crescimento económico do Brasil e bastou haver vontade politica baseando-se em critérios irrealistas como a unificação da língua e simplificação que não existem e juntando a sua sede de protagonismo e de realização pessoal como são os políticos de hoje em dia, este AO adquiriu um poderoso aliado.

A velha questão das consoantes mudas: As consoantes mudas é algo que é "more than meets the eye". Porque é que os brasileiros não escrevem as consoantes ditas mudas? porque basicamente não precisam devido à sua forma de falar em que acentuam sempre as vogais, tal como fazem os italianos e espanhóis, e no qual usam o acento circunflexo ou o trema para indicar quando é para fechar a vogal. Cá, é extremamente o oposto, somos como os russos,aliás não é raro os estrangeiros confundirem o português de PT com o russo devido à sonoridade da fonética das duas línguas que são muito similares, falo por experiência própria. ;)

Porquê essa comparação com o russo? porque tal com o russo, fechamos naturalmente as vogais a não ser quando existe um acento e sejam silabas átonas por questão históricas como a vogal antes da letra L (herança árabe, Algarve, Alface Alcácer, etc.) ou, surpresa ou não, quando existem as "malvadas" consoantes mudas, que está até escrito no acordo de 1945 a sua função de não só pela sua etimologia como também pelo seu factor de acentuação da vogal anterior Podem verificar aqui (página 11 Base VI):

http://www.priberam.pt/docs/AcOrtog45_73.pdf

Neste mesmo acordo de 1945 acabou-se as consoantes mudas após o I e o U porque essas não alteram a acentuação dessas vogais, agora uma boa pergunta aos acordistas seria porque é que acham que só eliminaram essas vogais e não as outras? Duvido que tenha sido por preguiça para não fazerem ás outras vogais. É que isso não pode ser visto numa de "se não digo, não escrevo" nesse caso teria-se que tirar o H, o U no que, qui, gue, entre outros exemplos.

"Só altera a ortografia e não a fonética": bem isso é muito discutível porque uma coisa é o que dizemos, outra é o que lemos. eu posso afirmar que digo farmácia com ph, mesmo que a escreva com f, porque foneticamente o som é igual. Se ler uma palavra como "correto" irei ler como "corrêto" como se diz em palavras como Barreto, cloreto, careto, coreto, corretor (da Bolsa) e não "corréto", porquê? porque não há lá nada que me diga que tenho que abrir aquela vogal irei naturalmente fechar as palavras, o mesmo irá acontecer se retirarem as "malvadas" das consoantes mudas, retiram o c objecto e espectador irei ler como objêto, espetador, por isso, sim acho que irá alterar a fonética, talvez não agora mas nos próximos anos.

É que essa "regra" de que letra que não é pronunciada não se escreve vai criar uma confusão, por exemplo, se eu pronuncio o p de Egipto, então, logo escrevo, ou seja, vai abrir um precedente em que as pessoas irão escrever como dizem, basicamente será a lei da selva. o mesmo posso dizer das diferenças das duplas-grafias, além de referir que teoricamente os nomes próprios (como nome de países) não iriam ser alterados,nesse caso porque é que Egipto é alterado e Entre-os-Rios já não? No texto do acordo está escrito que já ninguém diz o p de Egipto, como é que provam isso? fizeram algum estudo, sondagem para provar o que escreveram? onde é que está o fundamento disso? olha, eu sou um dos que diz o p de Egipto e de outras palavras que cortaram a p ou c e muito mais gente também o diz, basta ir ver a foruns, blogs, debates pela internet e vê-se que a diferença entra as pessoas que dizem o p de Egipto e aquelas que não dizem é 50/50. Por isso, usando a linguagem da internet, dizer que já ninguém diz o de Egipto é como eu dizer que sou a Rainha de Inglaterra, ou seja, your argument is invalid.


No caso das duplas grafias, posso referir o exemplo da página facebook do provedor do Telespectador da RTP, que surgiu há uns meses atrás como Provedor do Telespetador, só que recebeu tantas criticas (pudera, quem é que ia gostar de ser tratado como espetador) então ele alterou para Telespectador, porque, é uma das inúmeras palavras em que existe a dupla grafia, tal como em recepção, excepto, expectativas, concepção,lectivo, espectadores, adoptar!! entre muitas outras que se pode continuar a escrever.

Há 500 anos os portugueses não falavam como agora, por isso é que tinha uma ortografia diferente da actual, e simplesmente não vejo nenhuma alteração da forma como falamos agora da como se falava em 1945 (a não ser expressões diferentes) que justifique alterar a ortografia. É nisso que considero o AO totalmente inútil


O AO tem como objectivo é a criação de uma ortografia unificada a ser usada por todos os países de língua oficial portuguesa.
: A grande falácia dos acordistas, totalmente falso, irá continuar a haver PT-PT e PT-BR, ou seja: continuará a existir dupla ortografia: um dos grandes argumentos é que fazia muita confusão às criancinhas e aos estrangeiros ler palavras como acção, acto, embora essas palavras serão "unificadas"(criando aqueles problemas acima identificados), a dupla grafia continuará a existir, aliás até triplicará porque foram criadas novas dupla grafias que nem sequer existiam antes, como (PT-PT/PT-BR): aspeto/aspecto, espetador/espectador, receção/recepção, letivo/lectivo, exceto/excepto entre muitos outros exemplos, nenhum brasileiro irá escrever palavras como letivo, exceto, aspeto,receção como nenhum português irá escrever facto sem c, por isso por isso, unificação da grafia aonde???.

Aliás o próprio texto do AO diz que é impossível haver a unificação, mas no entanto continua os seus agentes a usar essa palavra como uma grande verdade. Lá está, a tal palavra de tamanho grande com o asterisco.

Eu lia quando era miúdo livros, banda desenhadas e enciclopédias escritas em PT-Br, e percebia bem a escrita, apesar das diferenças que se notava como as expressões que se usam no Brasil, de não usarem alguns c e p, É este tipo de conhecimento (que adquiríamos nos primeiros anos de escola) que os acordistas não têm ou, se têm, pretendem ignorar

"Este acordo pretende pôr fim à existência de duas normas ortográficas divergentes, uma no Brasil e outra nos restantes países de língua portuguesa" Já desde o ano 2000 que são aceites as duas grafias quer em Portugal e PALOP e Brasil com o Tratado da Amizade, criando uma situação semelhante à que existe entre por exemplo Reino Unido e EUA, por isso torna completamente obsoleto a criação desse AO.

Mercado lusófono: irá continuar a ter que ser preciso fazer traduções ou adaptações de livros brasileiros para PT-PT e vice-versa devido ás diferenças de expressões, sintaxe das palavras de cada país. Por isso, o pessoal que faz trabalhos nas escolas, não esfreguem as mãos de contente, vão continuar a ser bem óbvios os copy-paste de passagens de livros brasileiros.

" O AO contribui assim para o aumento do prestígio internacional do português e para a sua expansão e afirmação, se não se aceitar o acordo, o português em PT desaparece": Esses argumentos, a par do argumento de se ter que aceitar o AO porque o Brasil tem 180 milhões de pessoas, são para mim os argumentos mais estúpidos e demagogos dos "acordistas", estou-me nas tintas se o português é falado ou escrito por 1 milhão ou por mil milhões, enquanto houver uma pessoa a falar e escrever português ela nunca desaparecerá. Não é um AO que irá catapultar o português no plano internacional, são sim, os seus agentes, escritos, actores, artistas, cientistas, médicos, políticos etc. é como disse, são os tais argumentos como as letras gordas dos anúncios das publicidades enganosas

E finalmente, mas não menos importante:

"O acordo é lei": NÃO!!!! não é, nem nunca foi, o acordo é resultado de uma resolução da assembleia da republica, não é um decreto-lei, não tem valor jurídico ou sancionatório, ou seja, ninguém pode ser recriminado, preso, multado, ou até mesmo despedido, etc por se recusar escrever em acordês.


Isto não é facto consumado, nem é tarde demais para mudar as coisas, existe uma ILC para travar essa completa imposição digna de regimes autoritários http://ilcao.cedilha.net/?tag=ilc

Conclusão: é um acordo desnecessário, veio criar um problema que não existia, foi rejeitado por vários estudos de entidades linguistas quer do Brasil como em Portugal, infelizmente está e foi abafado pelos media (excepto na Internet e no Jornal Público) e também pelas pessoas que andam mais preocupadas com a crise do que propriamente da forma como se escreve, foi a táctica perfeita para os acordistas aprovarem sem criar muito barulho. Mas nada é eterno, por isso é que está a ser feita a ILC para suspender o acordo e estabelecer uma revisão desse. Aliás as diferenças entre um e o outro são tão grandes, que é apenas natural que um dia o Brasil institua a sua própria língua(o tupi ou outro nome que queiram dar). Não é por isso ou por esse AO que os portugueses e brasileiros irão perceber-se melhor ou pior do que agora ou há uns anos atrás.

Uff, o texto já vai longo. Ainda havia muita coisa para referir mas acho que grande parte foi explicado. Este blog tal como a minha escrita no dia-a-dia não irá submeter-se a acordo impostos, mal-feitos, criticados (excepto por aqueles que o financiaram, estou a falar de vocês, Porto Editora e Grupo Leya) por todos e sem mais valia nenhuma, até haver um acordo que respeite as características etimológicas da língua de cada país que não atropele regras gramaticais como as das acentuações das palavras. Uma coisa é certa, nunca irei "adutar" este acordo de merda!